Desinformação não é um problema de conteúdo, mas do caminho que ele percorre

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Jan 25, 2024
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desinformação
conteúdo
caminho
fake news
percolação
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Há uma tendência em se imaginar que censurar ou impedir conteúdos de serem produzidos acabaria com as fake news. É um erro - o ataque tem que ser sistêmico.
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Ao discutir fake news, geralmente focamos nas pessoas e conteúdos envolvidos, suas motivações e ações desonestas. Contudo, um aspecto menos explorado é a estrutura subjacente que permite a propagação desses conteúdos. Nesse contexto, surge uma proposta intrigante: será que a teoria da percolação, um conceituado framework matemático utilizado em física, matemática e ciência da computação, poderia oferecer insights para combater a desinformação?
Vamos retroceder um pouco. Por que devemos explorar a teoria matemática e a desinformação juntas? A justificativa é que as redes se comportam de maneira consistente em diversos campos, desde a computação até a agricultura, e da arquitetura ao comportamento social. Não é coincidência que as redes sociais se tornaram uma parte vital das sociedades modernas. As redes são um elemento que está presente em tudo, logo, faz sentido que seja um ponto de vista através do qual conclusões até então impensáveis fiquem claras. Analisar entidades a partir de uma perspectiva de rede pode parecer estranho para alguns, mas o fato é que, examinar questões do ponto de vista de suas redes permite a introdução de ideias diversas. Muitas vezes, essas ideias são revolucionárias.
A teoria da percolação permite o estudo de clusters conectados dentro de uma rede, analisando o surgimento e crescimento destes à medida que conexões são adicionadas ou removidas. Esta abordagem poderia ser útil para entender a estrutura e a resiliência das redes de desinformação, sugerindo estratégias para sua contenção e mitigação.
Um conceito central na teoria da percolação é o do limiar crítico, que representa o ponto em que uma rede se torna conectada. Ao aplicar esse conceito às redes de desinformação, poderíamos entender melhor as condições que facilitam a disseminação de informações falsas. Simular a propagação de desinformação e ajustar a força das conexões entre nós poderia revelar o limiar crítico, destacando a vulnerabilidade da rede à desinformação.
Por exemplo, consideremos uma série de computadores inicialmente desconectados. Conforme começamos a conectá-los aleatoriamente, formam-se pequenos clusters. O limiar crítico ocorre no momento em que uma conexão específica permite que vários clusters se interconectem, desbloqueando um potencial de rede anteriormente restrito.
Além disso, a teoria da percolação pode ajudar na avaliação da robustez das redes de desinformação contra intervenções. Interrompendo nós ou conexões-chave, poderíamos medir a eficácia de estratégias para impedir a disseminação de informações falsas. A teoria também pode ser valiosa na avaliação de contramedidas contra desinformação. Injetando informações precisas ou narrativas corretivas, poderíamos determinar o impacto destas na propagação de informações falsas e na fragmentação da rede.
Embora ainda não esteja comprovado que todos os aspectos da percolação aplicáveis à física e matemática sejam válidos para redes de desinformação, os conceitos sugerem uma nova perspectiva. Avaliando e categorizando nós segundo suas capacidades de disseminação de desinformação, podemos visualizar a rede como um mapa e atuar sobre nós-chave, visando desmantelar a estrutura que sustenta o fluxo de informações falsas. Esta abordagem representa uma possível estratégia para combater a desinformação, mas requer mais investigação e validação.

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