Suspeita de Princeton sobre Facebook pode não ser tão absurda

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Jan 24, 2014
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Suspeita de queda drástica na base de usuários do Facebook levanta debates sobre o futuro das redes sociais e a busca por conexões mais nichadas.
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Dois pesquisadores da Universidade de Princeton levantaram uma certa polêmica nesta semana ao publicar um estudo (pdf) que aposta numa queda de 80% na base de usuários do Facebook num prazo curto (entre um e três anos). A rede social de Mark Zuckerberg tirou um sarro da pesquisa (de modo até bem-humorado, dizendo que Princeton não terá mais nenhum aluno até 2021), mas a leitura do estudo suscita uma ideia interessante e mesmo que a previsão seja catastrofista demais (para o Facebook, claro), carrega indicadores que apontam um caminho no qual o futuro seja mais nicho e hiperconexão do que massa e plataformas fechadas.
O que diz o estudo (interessante de ler, mesmo para leigos): basicamente os pesquisadores comparam a evolução da base de usuários a modelos matemáticos similares aos que explicam a disseminação de doenças altamente contagiosas, como a febre bubônica, por exemplo. Segundo os pesquisadores, os modelos não só serviram para explicar a disseminação do Facebook, mas também se encaixam quando aplicados à curva descendente do MySpace, rede social que implodiu após sua compra pela News Corporation.
Mas o que uma rede social tem a ver com uma doença infecciosa? Bem, piadas possíveis à parte, segundo o estudo, os mesmos modelos matemáticos que funcionam quando aplicados às curvas de evolução de epidemias, servem para rastrear o modo como uma ideia se espalha por exemplo. Ainda segundo a pesquisa, no caso das ideias, uma determinada população deixa de aderir a um pensamento específico depois de um certo estágio da "infecção", cuja equivalência no caso da doença seria a "imunização" que faz com que, no caso da epidemia,  a população não seja extinta.
O bom humor da nota do Facebook argumenta que nem toda aplicação de modelos matemáticos serve para qualquer coisa - o que é verdade. Mas é bastante curioso que algumas projeções numéricas se repitam em situações tão diferentes quanto a evolução da febre bubônica e o crescimento de uma rede social. E como a matemática é a linguagem mais universal de todas, independente mente da sua precisão, talvez o estudo seja útil para projeções mais abrangentes.
Redes sociais são, por excelência, comunidades virtuais que unem pessoas com interesses semelhantes. Elas basicamente florescem por conta de uma razão - a de promover troca de informação entre indivíduos e/ou agremiações, empresas, entidades, etc. Digamos que o sistema circulatório de uma rede social é a quantidade de informação que ela movimenta. Usando a mesma alegoria, obstruções nessa circulação tendem a ser lesivos ao funcionamento dela como um todo.
Acontece que, na prática, as redes sociais não são geridas como organismos vivos, como sugere a alegoria. Elas são negócios, cujo único objetivo (na maioria esmagadora dos casos) é gerar dinheiro. Independentemente de quanto essas intervenções em busca de mais receita possam ser nocivas ao funcionamento saudável da rede a longo prazo, nada importa além de apresentar lucros para os acionistas (desde a fábula de Esopo da galinha dos Ovos de Ouro até o filme A Corporação, nem a lógica de que o perigo de morte amaina a ganância serve para mudar a vocação humana em priorizar o resultado a curto prazo).
A natureza da aglutinação de pessoas em torno de interesses não reconhece, contudo, a necessidade de acionistas em ganhar dinheiro. Pessoas aderem a redes sociais porque obtém um ganho delas - informação, satisfação, novos contatos, vantagens profissionais. Uma vez que esses interesses são sobrepostos por outros, a rede social afrouxa seu elo.
Não só o Facebook, mas todas as redes sociais, seguem caminhos contra a corrente, no que diz respeito tanto de observar o interesse comum quanto da troca de informação. Esses serviços tratam as informações coletadas pelos usuários a sete chaves, às vezes até proibindo ferramentas de medição como o ComScore de avaliar certo tipo de dados. Trata-se de algo óbvio no modelo de negócio atual: o ouro da galinha aqui não são os usuários, mas os dados que eles fornecem em troca do serviço. E rigorosamente, dane-se qualquer outro tipo de consideração que vá contra esse raciocínio.
O meio digital não veio para eliminar os meios de comunicação em massa, mas indiscutivelmente vai obrigá-los a jogar outro jogo. Usando outra alegoria, é como a TV a cabo, que nos enfia canais inúteis goela abaixo. Nesse novo cenário, as TVs a cabo vão desaparecer, porque não  vamos mais aceitar o que se quer oferecer. A lógica será invertida, por bem ou por mal, com mais ou menos sacrifício e a oferta terá de passar a ser daquilo que queremos. E quanto mais essas plataformas aceitarem se conectar às outras, mais vantagens terão, especialmente porque esse tipo de abertura a informações externas as obrigará a estar em constante evolução - coincidência ou não, outra similaridade com as observações do mundo natural.
A tentação por abrir a galinha e pegar todo o ouro de uma vez, entretanto, é grande demais desde que Esopo era bebê. A previsão de Princeton para Facebook soa um pouco radical, mas provavelmente carrega material para reflexão - até porque não é segredo que o Facebook está perdendo empuxo com os usuários mais jovens, que preferem platafformas como o Snapchat . Redes sociais e todas as outras operações que visem lucro não vão deixar de aplicar seus modelos de negócios e estratégias de marketing por conta de um risco teórico. A dose de precisão do estudo de Princeton será esclarecida pelo tempo - com a colaboração do Facebook que pode - ou não - levar o alerta em conta.

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